HISTÓRICO DA REDE PUXIRÃO

A emergência de identidades coletivas no Brasil nas últimas décadas tem revelado a existência de diversos grupos étnicos, organizados em movimentos sociais, que buscam garantir e reivindicar direitos, que sempre lhes foram negados pelo Estado. Desta forma, compreendem-se sem exaustão os motivos para o qual um país tão diverso em sua composição étnica, racial e cultural, a persistência de conflitos oriundos de distintas visões de mundo e modos de vida, que desencadeiam desde o período colonial, lutas pela afirmação das identidades coletivas, territorialidades especificas e reconhecimento dos direitos étnicos.



Na região Sul, especialmente no Paraná e Santa Catarina, a invisibilidade social é uma das principais características dos povos e comunidades tradicionais. Até pouco tempo atrás, a inexistência de estatísticas e censos oficiais fez com que estes grupos elaborassem seus levantamentos preliminares numa tentativa de afirmarem sua existência coletiva em meio a tensões, disputas e pressões que ameaçam seus diretos étnicos e coletivos garantidos pela Constituição Federal de 1988 e, diversos outros dispositivos jurídicos infraconstitucionais[1].



Destas demandas surge, na região Sul, a Rede Puxirão dos Povos e Comunidades Tradicionais, fruto do 1º Encontro Regional dos Povos e Comunidades Tradicionais, ocorrido no final do mês de Maio de 2008, em Guarapuava, interior do Paraná. Neste espaço de articulação, distintos grupos étnicos, a saber: xetá, guaranis, kaingangs, faxinalenses, quilombolas,benzedores e benzedeiras, pescadores artesanais, caiçaras, cipozeiras, religiosos de matriz africana e ilhéus; tais segmentos se articulam na esfera regional fornecendo condições políticas capazes de mudar as posições socialmente construídas neste campo de poder. Ademais, a conjuntura política nacional corrobora com essas mobilizações étnicas, abrindo possibilidades de vazão para as lutas sociais contingenciadas há pelo menos 3 séculos, somente no Sul do País.



terça-feira, 27 de abril de 2010

Juiz federal dá parecer favorável a ilhéus do Rio Paraná e anula decreto que cria Parque Nacional

No último dia oito o juiz Nicolau Konkel Júnior, da Vara Ambiental e Residual da Justiça Federal de Curitiba, sentenciou a suspensão do decreto presidencial s/nº de 30 de setembro de 1997 que cria o Parque Nacional (PARNA) de Ilha Grande, localizado no Rio Paraná entre os estados de Mato Grosso do Sul e Paraná. A decisão do juiz é resposta a uma ação civil pública movida em 2005 pela Colônia de Pescadores z-13, de Guairá no Paraná.

Com a anulação do decreto o Parque Nacional de Ilha Grande deixa de existir. Em sua sentença Konkel Júnior pautou vários pontos falhos na criação da reserva de proteção integral, entre eles o atraso demasiado na implementação do plano de manejo para as populações que residiam no local antes da criação do parque. O plano, que tinha prazo máximo de cinco anos para ser criado e colocado em prática, segundo informações preliminares, foi entregue há pouco mais de 60 dias, quase treze anos após a criação da reserva.

Durante esse espaço de tempo os ilhéus que viviam e os que ainda resistem dentro da área do Parque Nacional passaram a ser alvo de diversas sanções impostas às suas atividades de subsistência pelos órgãos ambientais. Multas, apreensões de equipamentos e ameaças de despejo fizeram com que os ilhéus fossem submetidos a um constante e sistemático tratamento que os relacionava a condição de agentes da degradação ambiental. Vale lembrar que a demora na entrega do plano de manejo impediu que as pessoas que deixaram a área fossem indenizadas pela desapropriação do território, fato que acarretou graves problemas sociais e econômicos a mais de 10.000 famílias de ilhéus, compulsoriamente dispersos por várias regiões do país.

É importante salientar que os ilhéus durante décadas habitaram as ilhas do Rio Paraná e são responsáveis pela conservação da fauna e flora local, já que suas atividades econômicas são autorreguladas por acordos de conservação dos recursos naturais, pois a preservação da natureza é critério fundamental dentro de suas práticas tradicionais. Esse legado foi motivador do anseio de criação da referida unidade de conservação, no entanto, a imposição do PARNA de Ilha Grande decretada em 1997, desconheceu de forma arbitrária a existência desses povos e comunidades tradicionais que habitavam a região. Tal menosprezo repetiu a mesma lógica promotora de “limpeza étnica” que atingiu uma década antes a população, em razão do impacto provocado pela construção de ITAIPU, seguido pelas cheias provocadas quando do enchimento do lago, na qual milhares de famílias que habitavam as ilhas perderam parte considerável de seu território tradicional.

Vale destacar que essa ação civil pública sentenciada em Umuarama abre uma discussão a respeito da sobreposição de unidades de conservação em territórios tradicionalmente ocupados por comunidades tradicionais e que de forma criminosa vem privando-os de direitos constitucionalmente garantidos, mediante adoção de medidas repressivas por chefes das unidades de conservação e órgãos de fiscalização ambiental, conforme inúmeros casos registrados com destaque no PARNA de Ilha Grande e PARNA de Superagui, neste caso, contra comunidades tradicionais de pescadores artesanais.

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